Quando decidiu estudar as harpias da Amazônia, em 2016, maior ave de rapina do Brasil à beira de extinção, o biólogo especialista em predadores Everton Miranda se assustou com o que viu: relato de 181 águias da espécie mortas em dois anos apenas no norte de Mato Grosso, uma região de 3 mil km² que integra o chamado Arco do Desmatamento.
Para investigar o motivo, o biólogo conta que entrevistou moradores locais, como “sitiantes, latifundiários, grileiros e outras figuras, em sua maioria pecuaristas que produzem carne”.
O resultado das entrevistas foi ainda mais preocupante: os relatos indicavam que 80% das harpias abatidas no período haviam sido mortas por curiosidade e os outros 20% por retaliação contra ataques aos animais da região – a harpia é predador natural de macacos e bichos-preguiça.
‘”Matei pra ver com a mão’, ‘atirei pra ver o tombo’, ‘matei por que nunca tinha visto um ‘gavião’ desse tamanho’ eram algumas das respostas que eu recebia”, lembra Miranda.
Na época, Miranda, que desenvolvia seu doutorado na Universidade de KwaZulu-Natal, na África do Sul, recebeu um financiamento internacional para sua pesquisa com as harpias e, em troca, precisaria propor soluções para o problema.
Foi aí que, inspirado no turismo de observação das onças pintadas em seu habitat natural, famoso no Mato Grosso, nasceu a ideia de transformar a harpia, conhecida no país como gavião-real, em símbolo do turismo local.
“O comportamento da harpia é conveniente ao turismo: elas não se deslocam, fixam ninho em um local e não saem dali se não forem forçadas a sair. Então, precisávamos localizar os ninhos e montar torres de observação próximas para que o turista observasse a aves”, explica Miranda.