O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgará, nesta terça-feira (7/5), recurso do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) solicitando a invalidação da absolvição de Gabriel Ferreira Mesquita, dono do bar Bambambã, localizado na Asa Norte, pela 3ª Turma do Tribunal de Justiça do DF (TJDFT). Gabriel é apontado por 12 mulheres como suposto autor de abuso sexual.
No processo, que será avaliado pela Corte Superior, uma das vítimas narra que, inicialmente, consentiu a relação com Gabriel. Contudo, em determinado momento, pediu que ele interrompesse o ato, mas o réu teria ignorado, “forçado sexo anal” e a violentado.
Gabriel chegou a ser condenado, em 2022, a 6 anos de prisão em regime semiaberto, pela 2ª Vara Criminal de Brasília. Contudo, a defesa do acusado recorreu, o depoimento da vítima foi invalidado e Gabriel foi absolvido pela 3ª Turma do TJDFT, em maio de 2023.
Para a assistente de acusação Manuela Paes Landim, ao absolverem o empresário, os julgadores consideraram que “o fato de a vítima ter pedido pra parar o sexo anal por diversas vezes não bastou para que o abusador entendesse que ela não queria”.
“Como ele não usou de violência física – apesar de seu corpo pesando sobre o de uma mulher que se sentia dopada – os magistrados da 3ª turma do TJDFT se apoiam no artigo 213 do famigerado Código Penal, que só considera o crime de estupro quando a conjunção carnal é praticada ‘mediante violência ou grave ameaça’”, explicou.
“O STJ, na prática, vai julgar se o não é não ou se é preciso que o não da vítima seja ‘mais sério’, ‘mais forte’, ‘mais contundente’, ‘mais heróico’. Caso prevaleça esse entendimento, haverá uma negativa do artigo 213 do Código Penal por não reconhecer como violência o que essas mulheres sofreram”, pontuou.
Para a advogada, caso o STJ julgue improcedente o recurso, a decisão colocará em risco a palavra de vítimas de abuso sexual em todo o país. “A repercussão desse julgamento pode ser de amplo impacto em toda a sociedade brasileira, em especial para as mulheres, pois pode colocar em dúvida o entendimento de que o consentimento para o ato sexual é o que delimita o que é ou não estupro. Inúmeras denúncias poderão ser questionadas e invalidadas caso o STJ dê esse recurso como improcedente”, declarou Manuela.
O Metrópoles tentou contatar a defesa de Gabriel Ferreira Mesquita, mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem. O espaço segue aberto para futuras manifestações.
Julgamento do dono do Bambambã
O TJDFT invalidou o depoimento de duas das 12 mulheres que acusam o dono do bar Bambambã de estupro e absolveu o réu em dois dos três processos ao qual responde por abuso sexual.
No acórdão, publicado em maio de 2023, os desembargadores Demétrius Gomes Cavalcanti, Nilsoni de Freitas Custodio e Jansen Fialho de Almeida disseram que, no caso em questão, “os elementos de convicção dos autos não demonstraram, de forma robusta e inconteste, que o réu praticou sexo anal com a vítima, constrangendo-a, mediante violência ou grave ameaça”.
“Além disso [não há provas] de que o réu tivesse a inteira compreensão de que a vítima passou a se opor de forma séria aquilo que ele fazia, não restando caracterizado, portanto, o dolo. Impondo-se, assim, a sua absolvição por atipicidade da conduta”, declararam, à época.
Relembre o caso
Catorze mulheres conversaram com a reportagem e detalharam histórias de horror e traumas provocados pelo acusado, que supostamente cometia os crimes após dopá-las.
“Aconteceu em uma noite após o aniversário de um amigo. Ele me levou até o quarto, onde, inicialmente, consenti a relação. Quando terminamos, e após certo tempo, adormeci. No meio da madrugada, no entanto, fui acordada de forma extremamente violenta, com ele me virando de bruços e forçando sexo anal”, relatou Maria*, uma das vítimas.
Amigos do dono do Bambambã também ressaltaram o suposto perfil hostil do empresário. “Conheci o Gabriel ainda na juventude; inclusive, chegamos a morar juntos. Ele era uma pessoa envolvente e agradável, mas agressivo e violento quando confrontado”, descreveu um colega, que não quis se identificar.
“Ele [Gabriel] falou uma ou duas vezes sobre ter tido relação sexual consentida com uma mulher e, no meio do ato, ter partido para o sexo anal sem permissão da parceira. E [ele] teria achado o máximo”, completou o conhecido.
Em agosto de 2022, a 2ª Vara Criminal de Brasília condenou Gabriel a seis anos de prisão por um processo de 2018. Na denúncia, o réu foi acusado de forçar sexo com a vítima, aproveitando-se do fato de que ela estaria embriagada e sem condições de reagir.
*Nome fictício para resguardo da vítima.